sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Imigração e Transição Demográfica

Um assunto muito em voga atualmente é a suposta xenofobia sofrida por imigrantes brasileiros em Portugal. São encontráveis numerosos vídeos a respeito no youtube, sempre seguidos de comentários apaixonados de ambos os lados. O assunto não é novo. Já publiquei anteriormente uma postagem, procurando desmistificar o fenômeno da imigração do terceiro para o primeiro mundo, tema normalmente tratado de forma superficial e sensacionalista, invocando uma "invasão" e destacando a "benevolência" dos países ricos, que assim acabarão por perder sua identidade cultural e étnica no longo prazo. Há já 30 anos foi publicado uma análise hoje um tanto esquecida do francês Jean-Christophe Rufin, intitulada O Império e os Novos Bárbaros, onde é feita uma comparação com a antiga fronteira (limes) do Império Romano, urdida para apartar os bárbaros, mas que acabou transposta por estes mesmos povos.

Sabe-se que a penetração bárbara no Império Romano nem sempre teve a feição de uma campanha militar. Muitas vezes aqueles povos, consderados aliados, eram autorizados a habitar o interior das fronteiras. Analogamente, é preciso frisar que os "bárbaros" da atualidade não estão invadindo à força os países da Europa e da América do Norte - as portas desses países estão sendo abertas, pois há um interesse, ao menos de alguns, em receber esses imigrantes, e não se trata de benevolência. A população daqueles países não deseja mais realizar trabalhos pesados, nem mesmo o de ter filhos, e os imigrantes ali estão para realizar esses trabalhos e substituir aqueles que não nasceram.

A causa-raiz do fenômeno, portanto, não reside em crises passageiras, mas na inexorável transição demográfica: todos os países que atualmente recebem imigrantes estão com uma taxa de natalidade inferior a dois filhos por casal. Como se sabe, a taxa mínima para manter a população estável é de dois filhos - seria como se os pais se repusessem. A diminuição da população jovem causa a escassez de mão-de-obra para as ocupações menos qualificadas, tradicionalmente exercidas pelos mais jovens sem experiência. Os imigrantes os substituem, mas causam mudanças nos padrões étnicos e culturais da população, induzindo a conflitos.

Isso tudo é bem conhecido, embora muitos tapem os olhos para não ver. Mas uma discussão que se seguiu a um vídeo do youtube, referindo-se ao problema em Portugal, chamou-me a atenção para outro fato que também não tem sido apontado: a transição demográfica vale para todos, e a taxa de nascimentos no Brasil ja caiu para abaixo de dois filhos por casal.

E sim, o Brasil continua reebendo imigrantes. Será esse então, também nosso futuro, ser invadido por estrangeiros que entrarão em conflito com os locais? Os imigrantes pobres habitarão guetos e integrarão facções criminosas? Com certeza o fenômeno afetará o mundo inteiro, mas não da mesma maneira. Em determinado momento a transição demográfica também atingirá os países que enviam os imigrantes, então a populaçãa mundial começará a encolher. Isso pode ter um lado bom: o planeta pode acomodar uma população menor com menos pressão sobre o meio-ambiente, e diversas áreas hoje degradadas podem ser recuperadas.

Mas até que se atinja este ponto de inflexão, enormes mudanças ocorrerão na composição étnica de diversos países, com inevitáveis impactos sociais e políticos. E também religiosos. É possível que muitos países hoje cristãos, tornem-se majoritariamente muçulmanos. A taxa de crimes já está crescento aceleradamente em muitos países até pouco atrás vistos como modelos. É difícil prever o que esses países se tornarão no futuro. E o Brasil?

Há semelhanças e diferenças. O Brasil sempre foi um país de imigrantes, bem ou mal acostumado à diversidade - na verdade, foram esses imigrantes que constituíram o país. A imigração enriqueceu o Brasil, mas empobrece a Europa. Aqui, os bolsões de pobreza e crime, notadamente as favelas, nunca foram constituídos de imigrantes; em sua maioria são constituídos de descendentes de escravos. Diferente da Europa, onde os bolsões de pobreza e crime são essencialmente constituídos por estrangeiros e seus descendentes. Aqui, mesmo os imigrantes pobres, haitianos e angolanos, não têm sido encontrados em favelas nem dedicados ao crime.

O Brasil do passado, imenso e despovoado, carente de empreendedores e de profissionais qualificados, necessitava de imigrantes como um balão necessita de ar. Mas será que os imigrantes continuarão a ser absorvidos, ou já estamos nos tornando algo parecido com a Europa? E afinal, por que a Europa, que economicamente necessita tanto dos imigrantes, tem tanta dificudade em absorvê-los socialmente?

A melhor resposta pode ser encontrada em um comentário de Rufin, no já citado O Império e os Novos Bárbaros:

"O império do norte, próspero e em processo de envelhecimento, tende a ter os mesmos objetivos dos cidadãos de meia-idade que o compõe: não se reproduzir, não se disseminar, mas durar, o máximo possível no doce aconchego da paz e da tranquilidade"

Os imigrantes queixam-se da xenofobia, mas xenofobia é caracteristica de indivíduos que não têm mais qualquer interesse por algo senão eles próprios, que nada mais querem mudar, visam apenas seu tranquilo final de vida e não dão nenhuma importância para o que virá depois.

Nenhum comentário:

Postar um comentário