O Sete de Setembro costuma ser um feriado morno, com manifestações esquematizadas, o tradicional desfile. Afinal, a independência do país é um dos raros eventos históricos sobre o qual há unanimidade: alguém aí é contra a independência? Mas o deste ano promete surtir um efeito extra, em razão das manifestações programadas pelo presidente Jair Bolsonaro.
O fenômeno já é conhecido: de tanto em tanto surgem personagens improváveis em nossa História, tipo corpos estranhos ao sistema, que cruzam o céu da política em uma trajetória meteórica, chegam ao ápice e logo depois desaparecem de forma inglória. O primeiro foi Jânio Quadros, fenômeno eleitoral que governou por sete meses e renunciou tentando um golpe que fracassou. O segundo foi Paulo Maluf, que furou a cena da sucessão que deveria ser controlada pelo presidente Figueiredo como era praxe do regime, mas seus colegas de partido preferiram implodir o partido a abrir caminho para o arrivista. O terceiro foi Fernando Collor, que de um partido nanico saltou para a presidência com um rosto jovem e um currículo antigo, e terminou impedido após provocar a pior crise econômica da História. Em comum, todos tinham um caráter de homem-forte independente dos clãs políticos tradicionais, um discurso bombástico e um posicionamento inclinado à direita. E todos foram expelidos como corpos estranhos ao organismo político nacional.
Eis que surge um quarto personagem com precisamente tais características. Fica no ar a pergunta: será que desta vez vai dar certo? O golpe que Bolsonaro arma para o sete de setembro vai triunfar onde falhou o golpe da renúncia de Jânio? Bolsonaro vai ser bem sucedido onde Maluf falhou ao obter o apoio de sua base aliada? Seus planos econômicos vão dar certo onde o confisco da poupança de Collor fracassou?
Pessoalmente não acredito. Todo fenômeno político que se repete termina banalizado, pois o roteiro torna-se por demais conhecido - primeiro acontece como tragédia, e depois se repete como farsa. E já é o quarto re-play. O próprio dia escolhido carrega algo de farsesco: a real data da independência do Brasil não foi o sete de setembro, mas o conhecido "dia do fico", pois desde aquela data o imperador já se encontrava formalmente rompido com o governo metropolitano. O sete de setembro foi escolhido posteriormente para simbolizar a independência, mas a sequência de eventos teria acontecido de qualquer maneira, independente do que Dom Pedro fizesse ou deixasse da fazer naquele dia. A partir daí toda uma mitologia foi erguida em torno da data, a começar pelo suposto grito. Os professores de História não deixam de lembrar que o imperador só parou às margens do Ipiranga porque estava com uma diarreia. Outros dizem que Dom Pedro estava indo a São Paulo só para se encontrar com sua amante, sendo que o imperador nem conhecia dona Domitila na ocasião - veio a conhecê-la nessa viagem por acaso. Querendo a todo custo achincalhar com o país, passam a mensagem de que a independência foi algo tão fortuito que aconteceu graças a uma indisposição intestinal e a uma pulada de cerca.
Com tanta farsa no ar, não dá para levar muito a sério este sete de setembro de Bolsonaro. Vou pagar para ver. Minha aposta é que a diferença entre Bolsonaro e os três aventureiros que o antecederam, será que ao contrário destes, Bolsonaro vai terminar seu mandato. Nada além disso.
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