Nenhuma personalidade esteve mais na berlinda nos últimos anos do que o educador Paulo Freire, proclamado patrono de nossa educação em 2012. Seus detratores afirmam que levando em conta os desastrosos resultados obtidos pelos estudantes brasileiros em todas as avaliações, Paulo Freire é um adequado ocupante de tal posto. É acusado de ser o maior responsável pelo fracasso de nossa educação. Agora, em seu centenário, tem recebido diversas homenagens. Herói ou vilão?
Vou expressar minha opinião desapaixonada. Não acredito que Paulo Freire seja o responsável por nosso fracasso educacional. E nem poderia ser, por uma razão cabal: ele não é um educador, e sim um filósofo. Vão dizer, mas ele tem um método. Sim, mas o método a ele atribuído destina-se à alfabetização de adultos, não é de uso geral. Sua obra magna, Pedagogia do Oprimido, não cita nenhum educador, mas apenas líderes revolucionários. Não tem nenhuma utilidade prática em pedagogia ou didática. Enfim, Paulo Freire é um personagem arcano, bom para receber títulos honoris causa e citações elogiosas - e nada além disso. Os maus resultados de nossos estudantes têm outras causas, mais prosaicas e diversas, desde a falta de condições de trabalho de nossos professores até o mau estado das escolas.
Mas se não é o responsável pelo fracasso de nossa educação, Paulo Freire é o responsável pela aceitação resignada deste fracasso, em razão do desprestígio da figura do professor e do próprio ato de educar, trazido pelas ideias que disseminou. Ao conferir um significado político ao ato de educar, Paulo Freire vendeu a noção de que a principal finalidade do professor não seria ensinar a matéria, mas "formar cidadãos" - conceito subjetivo que cada um interpreta como quiser. Então, qual é o problema das notas estarem baixas, se a real finalidade da educação não é essa?
Com seu edifício de teorias construído em um mundo onde só há oprimidos e opressores, Paulo Freire deu o papel de opressor ao professor que tenta ensinar, mais precisamente, ao professor que tenta passar conhecimentos ao aluno - atitude condenável de quem vê o aluno como uma conta bancária que recebe depósitos, o que denominou "educação bancária", própria do opressor que tenciona replicar na geração seguinte a mesma sociedade injusta da qual supostamente é beneficiário. Segundo essa abordagem, o aluno não sabe menos que o professor, mas ambos têm saberes diferentes, tampouco existe aluno mau ou aluno bom, apenas pontos de vista distintos.
Desta forma fica impossibilitada qualquer hierarquia de autoridade que permita ao professor impor disciplina e transmitir o que sabe ao aluno que não sabe, bem como invalidado qualquer tipo de avaliação que permita premiar o aluno capaz e esforçado. Foi aberto assim o caminho à nefasta aprovação automática, implementada por Freire, já que reprovar seria um ato de opressão, mas motivada pelo propósito mais pragmático de zerar as estatísticas de reprovação. Até o bom uso do idioma foi demonizado, posto que a norma culta seria uma imposição do opressor, e a maneira de falar do inculto - o oprimido - supostamente é tão boa quanto. Desnecessário frisar que o mau domínio do idioma dificulta o aprendizado de qualquer conteúdo mais complexo.
Somente abandonar as ideias de Paulo Freire não fará a nossa educação sair do buraco. Mas permitirá ao menos enxergar este buraco, e restaurar o papel correto do educador e do educando permitirá ao menos enxergar a direção a seguir.
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