Um mês atrás, eu nem sabia que Marina Silva era candidata a vice na chapa terceira colocada nas pesquisas. Agora, como todos os brasileiros, estou diante do maior fenômeno eleitoral dos últimos tempos, mais notável ainda por haver sido produto de circunstâncias fortuitas, um acidente de avião, sem nenhuma articulação por trás ou trabalho prévio de marqueteiros. Quanto a mim, não tenho maiores simpatias por Marina, como não tenho pelos outros candidatos, mas como comentarista sinto-me obrigado a pelo menos tentar decifrar o fenômeno.
Como é possível que um candidato com tanto potencial fosse originalmente lançado apenas como vice, em uma chapa sem chance sequer de passar ao segundo turno? Vivo Eduardo Campos, sua candidatura era um cadáver; morto o candidato, sua candidatura ressuscita no corpo de Marina. A explicação que eu encontro é a falta de base partidária de Marina, que tampouco possui base nas massas, em razão de sua falta de carisma. Mais difícil de explicar é de onde vieram tantas intenções de voto para uma candidata tão apagada. Mostram as estatísticas que Dilma perdeu poucos votos para Marina, o que não me espanta: o eleitorado petista, atualmente, é composto por aquela massa que vota no candidato que tem a chave do cofre. Como reza o provérbio, o eleitor tem a memória do burro, sempre se lembra onde come. Essa massa já pertenceu, no passado, à antiga ARENA do regime militar, foi depois herdada pelo PMDB de Sarney e agora é propriedade do PT: muda de partido, mas não muda de endereço, está sempre localizada nos rincões mais pobres e dependentes do favor do governo. Já Aécio Neves perdeu bem mais votos do que Dilma, passando a terceiro lugar, o que evidencia que o eleitorado de Marina é composto em sua maioria por um eleitor descontente com o PT, mas que também não se encantava com Aécio. Esse eleitor desalentado talvez votasse em branco caso não tivesse ocorrido o desastre de avião. A impressão que tenho é que finalmente surgiu um candidato com mínimo apelo popular para confrontar a hegemonia petista.
Mas por que o PSDB não empolgava os anti-petistas?
A explicação se encontra nos próprios fundamentos ideológicos do PSDB, um partido de centro-esquerda que foi obrigado pelas circunstâncias a adotar uma política "neoliberal", que é o nome que a esquerda dá aos cortes, privatizações e medidas de austeridade absolutamente indispensáveis para se tirar qualquer contabilidade do vermelho, seja a de um país ou a do botequim da esquina. O PSDB conspurcou-se com sua fama de neoliberal, enquanto o PT revelou total empatia com as massas, que clamam por um Estado grande e paternal. Por este motivo, o PSDB preferiu renegar o seu passado, desvencilhar-se da imagem de Fernando Henrique Cardoso, paradoxalmente seu líder mais bem -sucedido, e procurou emular o discurso neo-populista do PT. O resultado não poderia ser outro: derrota atrás de derrota. Afinal, quem vai querer a imitação barata se pode ter o original?
E por que Marina empolga os anti-petistas?
Essa é mais difícil de responder. Vejo em Marina uma personagem oca, revestida de um discurso feito de lugares-comuns ambientalistas. Não tem carisma pessoal nem base partidária, passou os últimos anos pulando de galho em galho. É tão oca quanto uma luva, que só espera que alguém coloque-a na mão. E quem será? O PT ou o PSDB? Um hipotético governo de Marina é uma incógnita total, sabe-se apenas que não será fácil, pois os oito anos de Lula deixaram uma pesada conta a ser paga. Esperava-se que Dilma pagasse a conta e deixasse tudo no azul para Lula voltar em 2014, mas isso não aconteceu. Afirma Aécio que o governo de Dilma acabou, mas não é bem assim; o governo de Dilma sequer começou. Então, talvez Marina acabe fazendo o papel que Dilma não fez: ser a "neoliberal" que vai arrumar a casa, arcar com o inevitável ônus de impopularidade e deixar tudo limpo para o retorno triunfal do PT em 2018.
O problema - repito mais uma vez - é que quem pode levar será o PSol, ao invés do PT...
Nenhum comentário:
Postar um comentário