segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Escola Sem Partido

Um dos projetos mais polêmicos do momento atual é aquele que institui a Escola Sem Partido. Suscita reações vigorosas, tanto de apoiadores quanto de opositores. Quanto a mim, não é surpresa. A descarada doutrinação nas escolas já vinha sendo denunciada havia tempos, e um sintoma de que o pessoal estava saturado disso foi o sucesso dos Guias Politicamente Incorretos, que já citei aqui várias vezes.

Mas o projeto dá medo, sim. Os alunos ganham a prerrogativa de denunciar um professor que supostamente tenta fazer doutrinação política, e isso pode criar um clima de retração e caça às bruxas. Uma coisa assim pode, efetivamente, ser usada para propósitos escusos. No meio desta polêmica, chamou-me a atenção uma entrevista do ex-senador e ex-ministro da educação Cristovam Buarque, intitulada Soviéticos e Nazistas Tentaram Escola Sem Partido e Falharam.

O título parece mais uma patacoada estilo Falácia Ad Hitlerum para demonizar certo movimento. De Cristovam Buarque não esperava mesmo outra coisa, sempre o tive como um comentarista de esquerda pouco imaginoso e especialista em platitudes. Por isso me surpreendi quando o vi reconhecer:
"Primeiro, é preciso reconhecer: muitos professores exageraram nos últimos anos, em vez de debater, querendo doutrinar. Houve certo exagero na maneira como alguns professores se sentiram donos da verdade de um partido"

Sim, finalmente um comentarista de esquerda admitiu. Anos atrás, eu já me horrorizava ao ler trechos de livros didáticos de História repletos de chavões em meio a erros gramaticais e linguagem chula. Comparando-os com os livros-texto de meus tempos de estudante, dava para ter uma boa ideia do quanto o nível do ensino caiu no país. Mas afinal, essa doutrinação que persistiu em nossas escolas por anos a fio surtiu algum efeito do ponto de vista dos doutrinadores?

Em um debate com um blogueiro esquerdista que também é professor de ensino médio, ele me respondeu categórico: "Tudo o que um professor espera hoje dos alunos é que não ponham abaixo a sala de aula". É, parece que eliminar a disciplina das escolas não foi uma boa ideia. Sem disciplina não se faz nada. Nem revolução. Outro comentarista que também foi professor de ensino médio disse: "Quando os alunos não estão a fim de assimilar uma coisa, pode repetir cem vezes que entra por um ouvido e sai pelo outro". Questionado pelo entrevistador, Cristovam responde com impressionante sinceridade:

"O pessoal fala em escola sem partido, mas o problema, no Brasil, é escola e ponto. Esse país nem tem escola [de qualidade], quer dizer, só tem para uma minoria. Estão querendo tirar o partido da escola antes de fazer a escola"

Sim, ele disse o óbvio. Como cultor de platitudes, a especialidade de Cristovam é mesmo dizer o óbvio, embora nem sempre com neutralidade. Eu já havia chegado à mesma conclusão: a doutrinação em sala de aula, seja do viés que for, é ineficaz para produzir uma geração de militantes, mas é eficaz para mediocrizar o ensino. Isso porque o raciocínio é substituído pela repetição de chavões. Não vendo nexo lógico entre a realidade perceptível e aquilo que o professor afirma, o aluno desacostuma-se a pensar. Um professor que diz coisas engraçadas, que debocha dos personagens históricos, dos ricos, dos famosos e de todos aqueles que despertam a inveja das pessoas comuns, sempre é popular entre as ditas pessoas comuns. Quando nada, será o professor de uma matéria fácil de passar, cujas aulas são divertidas.

E não é só isso: além de mediocrizar o ensino, um professor assim também detona a autoestima dos alunos. Todos são convencidos de que pertencem a um povo ordinário e patético, sem valor, cujos heróis são vilões e que não fazem nada que preste. O que um jovem que recebe esta mensagem vai pensar? Que ele tem mais é que mandar o país às favas, pois mesmo se ele fizer alguma coisa grandiosa, os professores de História do futuro vão dizer que ele foi um mané, igual fazem os professores do presente com os personagens históricos do passado. Não me parece a melhor maneira de formar militantes entusiasmados.

Os nazistas e comunistas, como se sabe, nunca criaram uma Escola Sem Partido. Eram regimes de partido único, e por conseguinte não tiveram nenhuma propensão em disfarçar que o Partido permeava a escola, tal como permeava toda a vida cultural e até social dos cidadãos. Se por aqui o projeto Escola Sem Partido vai materializar uma Escola de Partido Único (do governo), isso veremos. Cristovam concluiu:

"Nós precisamos é de um partido para a escola, porque não temos nenhum. Um partido que ponha a escola como eixo central do progresso"

É raro eu concordar com Cristovam, mas desta vez eu concordo.

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