quinta-feira, 8 de março de 2018

O sebastianismo e Lula

Um fenômeno recorrente na história brasileira é o sebastianismo. Remonta ao desaparecimento do rei português Dom Sebastião na batalha de Alcácer-Quibir, que deu origem a lendas de que o rei estaria vivo e ia retornar para consertar as coisas em casa e punir os usurpadores. Nada de novo. Uns séculos antes o povo inglês experimentou os mesmo sentimento em relação ao rei Ricardo Coração de Leão, que partira para as cruzadas. Muitos creditavam à sua ausência os problemas por que vinham passando, mas um dia o rei retornaria e repararia as injustiças. Quando Ricardo retornou, a primeira coisa que fez foi aumentar os impostos.

O termo sebastianismo designa, portanto, um sintoma depressivo, uma idealização de um passado encarnado em determinado personagem fora de cena, mas cujo retorno é anunciado e se afirma irá iniciar uma Era de Ouro onde os maus serão punidos e os males sanados. Ocorreram numerosos episódios de sebastianismo no Brasil, como em Canudos no final do século 19, quando a volta do rei Dom Sebastião foi anunciada para livrar o país do jugo da república. E como a história sempre se repete (como farsa, e depois como mais farsa) desenha-se no presente um novo surto de sebastianismo em torno da figura do ex-presidente Lula.

Ao que tudo indica, mesmo que não seja preso, Lula não poderá se candidatar para a eleição deste ano. Mas lidera todas as pesquisas até agora. Então, seja lá quem for o eleito, a sombra de Lula cairá sobre ele. Dirão que qualquer eleição sem Lula é ilegítima, e que Lula seria superior a qualquer outro candidato. Foi impedido de concorrer pela força, mas um dia retornará, qual o rei Dom Sebastião, e irá castigar os usurpadores e restaurar o reino de ouro que foi seu mandato na presidência.

É lamentável isso. O sebastianismo é, antes de tudo, um sinal de desalento. O que se pode fazer é interpretar essa realidade de maneira isenta, passando ao largo da discussão dos aspectos jurídicos da questão. Lula é lembrado pelo bom desempenho da economia durante seus dois mandatos e ainda é, de longe, o líder mais popular do país, mas não empolga a ponto de provocar uma revolução. Ele lidera as pesquisas, simplesmente porque não há outro - nem na oposição, nem em seu próprio partido. Mas seja qual for o desfecho da eleição, não é razoável supor que haverá uma ruptura institucional. O quadro institucional brasileiro mostrou-se capaz de barrar um governo que estava direcionando o país à derrocada econômica e à corrupção desenfreada, mas não mostrou-se capaz de produzir novas lideranças. O que temos é isso:

- O conjunto mais conservador do quadro partidário brasileiro, claramente chegou à esterilidade por senilidade. Já há vários pleitos não lança candidato próprio e tem se limitado a uma postura de vassalagem com vários governos. Ainda é essencial para conferir a governabilidade, como o recente episódio do impedimento de Dilma bem demonstrou, mas não é mais capaz de produzir candidatos.

- O PSDB, que deveria compor um bipartidarismo com o PT, ficou intimidado com a popularidade de Lula e preferiu renegar seu legado da era FHC, a despeito do sucesso do Plano Real. Plantou para os outros colherem, e agora está desmoralizado. Tem para oferecer apenas os mesmos candidatos que já foram derrotados e serão derrotados de novo.

- O PT está preso às ideias ultrapassadas do desenvolvimentismo varguista do século passado, que já demonstraram não funcionar no século 21 da globalização. Chegou ao poder puxado pelo carisma pessoal de Lula, carisma esse que está no fim. Não há outro candidato à altura.

O que resta é o surgimento inesperado de uma nova liderança de esquerda, do PSol ou da Rede, algo bastante improvável, ou a nem tão improvável eleição do candidato da direita Jair Bolsonaro. Aí, na melhor das hipóteses, ele abandonará o discurso radical, mas fará um governo menos que sofrível que deixará o povo disposto a experimentar outro candidato de esquerda daqui a 4 anos.

5 comentários:

  1. Ele é líder das pesquisas porque não se iniciou verdadeiramente a campanha das eleições presidenciais. Ele está na mídia, escrita, falada e televisada todos os dias, assim está presente na cabeça de todos. Ao se iniciar a campanha, aí sim, se fosse candidato, seria metralhado em todas as mídias pelos seus próprios erros. Pois , foi ele mesmo que jogou sua biografia no lixo, estando engajado em enorme corrupção e sendo processado em mais de seis processos. Portanto, não teria chance nenhuma de se eleger. Lula é carta fora do baralho por seus próprios erros. Se acha um Deus. Aliás, superior a Jesus Cristo. E aí está o seu maior pecado. Seu fim está só se iniciando.

    ResponderExcluir
  2. Esqueci de dizer que acreditar em pesquisas agora é como acreditar em Papai Noel, principamente da Data Folha.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Parei de acreditar em pesquisa em 2014.

      Eu acho que pesquisas são uteis pra uma estimativa, mas obviamente os institutos alteram os números pra satisfazer seus clientes. Não dá pra "forçar", se não o Bolsonaro estaria lá pra 5% e seria considerado um candidato "irrelevante", mas ao invés disso ele é levado à sério por todo mundo.

      Sem contar que nenhuma pesquisa é perfeita.

      Excluir
  3. Tanto a Esquerda quanto a incipiente Direita estão dividas, mas eu acho a esquerda muito mais divida.

    Estão disputando o legado do Lula, mas os candidatos apresentados são muito fracos. PSOL tá em franca guerra civil com a candidatura do Boulos, e estão se tocando agora que o PSOL sempre foi a linha auxiliar do PT.

    O que parece ter mais força até agora é o Ciro Gomes, mas ele sempre morreu na praia e acho que cedo ou tarde vão desmascarar ele essa ano. Ciro é um coronel que paga de gatinho porque é da esquerda, como se fossem impossivel um coronel esquerdista.

    ResponderExcluir
  4. A Direita tá divida entre Conservadores e Liberais, mas me parece que no fim vão todos se unir ao redor do Bolsonaro porque os Liberais não conseguiram um candidato bom.

    ResponderExcluir