O estudo do passado serve para entender o presente, e quiçá prever o futuro. Assistimos hoje ao segundo processo de impedimento de um presidente nos últimos 30 anos. Fica a questão: pode-se apontar algum paralelo entre o impedimento de Collor e o de Dilma?
Eu costumava responder que não. Os dois processos acontecem em contextos muito diferentes. Collor era o "rosto novo da direita" e Dilma é o rosto velho da esquerda. Collor não tinha um partido forte, e Dilma tem o PT. Collor não tinha o apoio das massas, e Dilma ainda dispõe de numerosos apoiadores. Na época de Collor havia um consenso quanto à sua culpabilidade, e no momento atual o país está dividido. As acusações feitas a Collor foram muito diferentes das acusações feitas a Dilma.
Mas tirando o contexto e concentrando o foco apenas nas pessoas de Collor e Dilma, vê-se que há, sim, algumas similitudes. Cada um a seu tempo, ambos foram inexperientes - Collor era muito jovem, um dos mais jovens dos presidentes brasileiros; Dilma é mais velha, mas nunca antes havia disputado uma eleição. Ambos foram arrogantes e subestimaram o poder de seus adversários, consequência natural da inexperiência. Ambos romperam com, ou não souberam manter sua base aliada no congresso. Enfim, faltou habilidade política, e tampouco tiveram o carisma que eventualmente permitiria um governo personalista. Uma vez que tais acontecimentos se repetiram em um intervalo de apenas trinta anos, pouco tempo em se tratando de política, não podemos considera-los fortuitos: identifica-se aqui uma regra geral que se aplica ao país. Esta regra é: no Brasil atual, nenhum presidente se mantem no poder caso perca a confiança dos principais partidos, aquela massa de siglas e nomes que parecem pouco relevantes, mas que juntos formam o núcleo do poder político, são o fiel da balança e detêm o voto de minerva. Bom ou mau, são eles a autoridade máxima do país, e uma vez que ninguém nesse país, muito menos o presidente da república cumpre a lei estritamente, sempre será possível invocar pretextos legais para o impeachment.
Há outra regra que pode ser identificada: no Brasil atual, o judiciário é independente e atuante. Nem Collor nem Dilma tiveram o poder de deter as investigações. Ainda mais com os novos dispositivos da legislação, como a delação premiada, parece ter-se inviabilizado daqui por diante que o apoio ao governo seja comprado com os usuais expedientes da corrupção - a menos que haja uma dramática reviravolta que exclua esses novos dispositivos legais, tal como sucedeu na Itália pós-mãos limpas, daqui por diante o país terá que inventar um novo método de fazer política e garantir a governabilidade. O que nos aguarda no futuro? Um parlamentarismo ex-officio, onde ao invés de processos de impeachment teremos o tradicional voto de desconfiança e a formação de novo gabinete? Não me arrisco a prever. As nuvens estão muito escuras.
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