Quem acompanha o meu blog sabe que gosto de identificar paralelismos entre ocorrências do passado e do presente, a fim de estabelecer padrões que se repetem e ver a mesma peça encenada por outros atores. Recentemente estive pensando: a crise atual tem alguma coisa a ver com a crise de 1989?
O ano de 1989 foi o último em que presenciamos, no Brasil, o fim de um ciclo e o início de outro. A ditadura já havia acabado, mas o nacional-estatismo fora tocado por Sarney com potência máxima, incluindo o congelamento de preços do Plano Cruzado, ponto máximo do intervencionismo estatal na economia, jamais ousado por um governo anterior. O retumbante fracasso do plano, bem como de outras políticas condizentes com o espírito da época como a Reserva de Mercado na Informática, enterrou não somente o governo Sarney mas também todo o ciclo nacional-estatista iniciado décadas antes por Vargas. No cenário arrasado surgiram outsiders: Lula e Collor de Melo. Venceu Collor. Seu governo acabou sendo um fracasso ainda mais retumbante, mas o país não voltou atrás: a partir de então estabeleceu-se o consenso de que o Estado devia encolher, desregulamentar-se, que nosso setor privado era ineficiente e acostumado a viver de subsídios do Estado, que o número de empresas estatais era excessivo e o Estado não tinha recursos para moderniza-las, que o nacionalismo tacanho tornava nossos carros iguais a carroças. Lenta mas inexoravelmente, tal como um transatlântico, o país mudou de rumo. Vieram o Plano Real, e as privatizações e a Lei de Responsabilidade Fiscal. O país parecia convencido enfim que as despesas não podiam superar as receitas.
O governo Lula inicialmente não reverteu esse quadro. Embora embalado por um discurso social e altamente crítico ao "neoliberalismo" de Fernando Henrique, Lula preservou com unhas e dentes a macroeconomia herdada do Plano Real. A inflação caiu e o PIB subiu. Pela primeira vez na nossa História, os trabalhadores experimentaram uma consistente melhora em seus rendimentos puxada pela estabilidade econômica e pela expansão do crédito. Mas Lula também implementou uma espécie de getulismo tardio, voltando a aumentar o tamanho do Estado, aumentando a carga tributária e subsidiando empresas nacionais com recursos públicos, comprando navios com soldas defeituosas de estaleiros nacionais pelo dobro do preço cobrado por um navio coreano com soldas perfeitas. As nuvens estavam no horizonte...
Com o governo Dilma inicia-se o efetivo desmonte da Era FHC e retorno ao nacional-estatismo, com o BNDES emitindo dinheiro para empresta-lo a juros subsidiados ao séquito de empresários amigos-do-rei. O último e essencial componente do antigo modelo - a inflação - ameaça voltar. A inflação foi saudada pelos próceres do nacional-estatismo, de JK a Celso Furtado, como essencial para o desenvolvimento, pois permitia ao governo cobrir seus deficits emitindo dinheiro e assim mandar a fatura para a população, que a pagava com a perda de seu poder aquisitivo. Essa ideia fazia algum sentido naqueles tempos em que tínhamos uma indústria incipiente e uma baixa carga tributária, mas na época atual, seu efeito imediato será liquidar todo o aumento de renda proporcionado por Lula à classe trabalhadora, o qual sustenta-se, como aqui já mencionei, na estabilidade da economia e na expansão do crédito que permite ao trabalhador "tirar" uma geladeira nas Casas Bahia pagando em 15 vezes. O povo já está sentindo isso no bolso, e a cúpula petista já percebeu que não vai colar.
Ao que tudo indica, como em 1989, vivemos o fim de um ciclo, o ciclo do PT no poder. Mas o que virá em seguida? Aventureiros outsiders como outro Collor de Melo? Uma radicalização que remete a outra crise, a de 1964? Ou recuando ainda mais até 1954, um auto-sacrifício de Lula que reverterá a onda anti-petista?
Ou talvez nada disso aconteça e o país fique em piloto automático, conduzido por super-ministros e eminências pardas.
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