Sentindo o alento que vem da perspectiva do fim da pandemia e da escolha de um novo governo para o ano que vem, é trazida de volta à baila um antigo dístico: o tal de "Projeto de Nação".
Já ouvimos muito essa história anos atrás, mas ela saiu de moda depois que se descobriu que o Estado era mais um peso do que um condutor para a economia. E após tanto tempo de desalento, ela nos causa uma certa saudade, evocando uma época em que ao menos acreditávamos no futuro. Escreveu Luciano Huck em um artigo:
Não há vento bom para uma nau sem rumo. O Brasil precisa de um projeto de nação. Um projeto de arquitetura, engenharia e construção.
A ideia de um Projeto de Nação, levado a cabo por um governo benévolo fiel a um receituário, surgiu no início da Era Vargas, com sua proposta de industrialização e modernização social. Mais industrialização que progresso social, na verdade. Desde então, a ideia foi encampada por governos de variados matizes ideológicos, democráticos ou ditatoriais, mas compartilhando da crença de que cabe ao Estado planificar e conduzir a economia (e por que não, tutelar o social). Embora comandada pela face autoritária de um presidente, a ideia tem atrás de si uma utopia. Somos o país do futuro, não? Ou pelo menos éramos. Quando foi que deixamos de ser? Escreveu o apresentador:
Infelizmente o Brasil hoje não tem a capacidade de liderar qualquer agenda global. Ao longo de todo o século XX, mesmo sendo um país pobre e em desenvolvimento, nós sempre fomos respeitados e reconhecidos pela nossa arte, arquitetura, música, cultura, esporte e agricultura. Na década de 50 fomos capazes de construir uma capital em 5 anos, tivemos a sensibilidade de encomendar uma cidade pelo olhos de gênios como Oscar Niemeyer e Lúcio Costa. Fizemos o primeiro palácio aberto, horizontal, envidraçado, nivelado na altura “do povo”. Longe do estilo rococó que materializava “o poder” ao redor do planeta.
Este Brasil infelizmente sumiu. Foi sufocado por uma visão míope das potencialidades brasileiras e atropelado por quem adora fazer apologia da mediocridade.
A utopia desapareceu. Sempre tivemos uma utopia. Vargas queria ser o Pai dos Pobres. JK tinha a utopia de Brasília. A garotada revolucionária dos anos sessenta tinha a utopia do socialismo. Os militares dos anos setenta tinham a utopia do Brasil Grande. Foram os militares, aliás, os autores do último Projeto de País, levando ao extremo o desenvolvimentismo nacional-estatista, que se esboroou nos anos oitenta, a "década perdida". Desde então o Estado Dirigista tornou-se um vilão, impedindo a economia de crescer com seus gastos excessivos, seus deficit´s e sua corrupção. Não acreditamos mais no poder transformador do Estado, mas parece que tampouco acreditamos em nós mesmos.
Quem fará o próximo Projeto de País? Desde o fim do governo dos militares, a pugna por um Estado Dirigista passou da direita para a esquerda, sendo encampada pelo PT, herdeiro do legado varguista. Em outros tempos Lula definiu a CLT como "o AI-5 dos trabalhadores". Hoje o PT defende-a com unhas e dentes, e no período em que esteve no poder, implementou uma espécie de getulismo tardio, reciclando um modelo desenvolvimentista e mesclando-o com conquistas na área social. Como se sabe, só funcionou enquanto bons ventos da economia mundial sopraram para o nosso lado. Se o PT chegar de novo ao poder nas próximas eleições, como indicam as pesquisas, terá que urdir um novo Projeto de País. Que ideias estão no ar? Voltando ao artigo de Luciano Huck:
É possível construir um futuro, encontrar saídas e retomar a esperança, mas isso só vai acontecer se a sociedade civil responder a um chamamento e se unir em torno do bem comum.
A agenda da sustentabilidade vai se impor. Quer dizer, já está se impondo. Não só porque é a escolha moralmente correta, mas também porque é importante para o sucesso dos negócios (...) O Brasil pós-2022 pode e deve liderar esta agenda verde, da agroindústria sustentável, da preservação, da floresta em pé, da proteção dos nossos povos ancestrais.
Vamos ter de definir nosso propósito e nossa missão. Quando você tem clareza sobre isso como nação, as oportunidades aparecem e o mundo vem até você. Nada virá por geração espontânea.
Parece um tanto piegas, sem dúvida, e tampouco Luciano Huck parece ser a pessoa mais habilitada a tratar desses assuntos. Sustentabilidade ao invés de fábricas. Mais respeito às minorias ao invés de mais direitos trabalhistas. O espírito da época está bem diferente daquele dos anos Vargas. Entretanto, continuo duvidando que pode haver um Projeto de País se não houver uma utopia por trás.
A opção mais lucrativa do presente pode não ser a do futuro.
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