domingo, 19 de abril de 2020

O Neoliberalismo de Bolsonaro

Há pelo menos 30 anos, um rótulo nos persegue: o neoliberalismo. Tão repetido que já ninguém sabe defini-lo: seu significado é auferido do contexto. Foi dito que FHC introduziu o neoliberalismo no país, então o neoliberalismo tem a ver com cortes, privatizações, diminuição do Estado. Atualmente é ponto pacífico que o governo Bolsonaro conduz um modelo econômico neoliberal, embora nenhuma grande privatização tenha sido anunciada até agora.

Mas quando se tenta proceder a uma análise que contrapõe versão e fatos, as contradições aparecem. Esse artigo levanta uma série que questionamentos:

"O Bolsonarismo é anti-globalista, anti-multilateralista, anti-ambientalista. Então como pode ter na politica econômica uma plataforma que depende da percepção positiva do conjunto dos países centrais que tem como linha de ação geopolítica o anti-populismo de direita e ter um comando Neoliberal Globalista na economia?"


"A combinação Bolsonarismo com Neoliberalismo é impossível sob o ponto de vista conceitual, é um coquetel explosivo e impalatável"


"O Bolsonarismo é um conjunto de ideias populistas de ultra-direita, um sistema incompatível com o Neoliberalismo, que é globalista e pelo Estado mínimo, uma mistura indigesta, incompatível com a lógica politica e econômica"


Pois a meu ver, a explicação para tanta contradição é simples e até óbvia: o neoliberalismo não pode coexistir com a política do governo Bolsonaro porque de fato nunca foi adotado por este. Em linguagem simples, chama-se procurar chifre em cabeça de cavalo.

Na realidade, o neoliberalismo nunca existiu no Brasil. Foi coisa dos EUA de Reagan e da Inglaterra de Thatcher, e tratou-se de uma reação contra os excessos do Estado de Bem-Estar Social, cujos gastos excessivos estavam provocando estagnação econômica e desemprego. Mas no Brasil, nunca houve um Estado de Bem-Estar Social. O Estado brasileiro quebrou por seus gastos excessivos para sustentar a si próprio, e não aos cidadãos. Os anos 80 presenciaram o colapso do modelo de Estado Forte que foi a regra no país e em seus vizinhos desde meados do século passado, aqui passando pelo varguismo até chegar aos militares e seu nacional-desenvolvimentismo, que teve o auge nos anos setenta e o esgotamento na década seguinte. Sobrecarregado por seus gastos, o Estado brasileiro passou de indutor do desenvolvimento a peso morto que brecava o desenvolvimento. O que se chamou então de neoliberalismo na Era FHC nada mais foi do que a sequência de cortes e privatizações que todo o governo tem que fazer quando gasta mais do que arrecada. O termo, inclusive, já se encontra em desuso no resto do mundo, e só é repetido aqui, onde se tornou sinônimo de tudo o que há de ruim.

Mas o rótulo nos persegue, e volta e meia lá estamos nós de novo procurando chifre em cabeça de cavalo. Na prática, até governos nacionalistas de esquerda podem ser "neoliberais" quando a necessidade aperta, como foram o peronista Menem na Argentina e Dilma Rousseff em seu segundo mandato. Talvez esta fixação em malhar o judas neoliberal seja um sintoma de nostalgia do antigo Estado Forte, que criava um poderoso ethos nacional, resgatando valores nacionais, fomentando a cultura nacional e o patriotismo. Quanto a mim, não tenho saudades.

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