Agora que a copa do mundo acabou, estamos livres para voltar à discussão de nossos velhos problemas. A bola da vez é a inflação. Diz a claque petista, agora que a revista Veja falhou em acusar o governo pelo fracasso na organização da copa, mudou de assunto e acusa o governo pela volta da inflação, objeto de um artigo no último número, apontando os riscos de liquidação do Plano Real. Recentemente o assunto voltou a ser objeto de um post no Centro de Mídia Independente, conhecido ponto de encontro de palpiteiros que, se não pode ser considerado uma fonte de artigos inteligentes, ao menos fornece uma boa amostra do que vai pela cabeça de nossos pretensos intelectuais - afinal, como já tive inúmeras vezes a oportunidade de observar, estudos ruins frequentemente dão bons objetos de estudo.
Quem teve a paciência de seguir o link e ler o post deve ter se deparado com uma coleção de argumentos bem destrambelhados. Não vou entrar em detalhes aqui, mesmo porque já dei uma resposta no citado fórum. Mas uma impressão que eu tenho é recorrente: o fim da inflação causou um mal disfarçado desagrado em muita gente por aí. Parece que esse pessoal preferia que a inflação não houvesse acabado.
Por que? Respondo sem dificuldade. Porque o sonho desse pessoal é trabalhar no governo, entrando por indicação de algum político ou movimento social. E inflação não é problema nenhum para quem emite o dinheiro - ou seja, para o governo. Inflação é problema para quem usa o dinheiro.
Para quem emite o dinheiro, longe de ser problema, é solução. Basta aumentar a velocidade da impressora da Casa da Moeda que a mágica está feita: os rombos das contas do governo estão cobertos, e a fatura vai para o desditoso usuário do papel-moeda. Qual governante não sonha com isso? Qual cidadão comum não sonhou ao menos uma vez na vida em fazer compras no shopping e mandar a conta para o vizinho?
Emitir dinheiro sem lastro causa o mesmo efeito que imprimir notas falsas. Quando se diz que o índice de inflação é 6%, o que se quer realmente afirmar é que, de cada 106 reais em circulação, 6 são notas falsas. É claro que o governo não pode fazer como antigamente, mas não custa impingir uns reaisinhos de mentira em meio aos verdadeiros... de leve... só 6 em cada 100, né? É como o ex-alcoólatra olhando para um copo. Mas a Dilma diz, toda empertigada, que não pode baixar mais a inflação porque, se assim fizer, estará aumentando o desemprego. Ora, empregos criados com dinheiro de mentira nada mais são que empregos de mentira, gerados à custa da diminuição do poder aquisitivo daqueles que já estão empregados! É como se o seu patrão chegasse para você e dissesse: vou descontar 6% de seu salário para criar um emprego para o seu colega que está desempregado. Ou se preferir, é como se fosse um imposto invisível, com a vantagem de que pode ser lançado sem aquela chatice de comprar deputados.
Muitos políticos desejam ardentemente ter de volta o prático imposto inflacionário, e no povão, a cultura inflacionária está tão arraigada que, para o senso comum, combater inflação é sinônimo de arrocho salarial e desemprego. O PSol promete reposições mensais da inflação, e ninguém se lembra de perguntar se, ao invés de fazer reposições mensais, o melhor não seria acabar com a inflação. No fundo, todos sonham retornar aos gloriosos tempos quando qualquer economista de meia-tigela podia reinventar a economia e a roda uma vez por semana, uma zorra tão grande que até alguém como José Sarney pôde fazer pose de populista com seu Plano Cruzado e a moratória da dívida. Olham com os olhos esbugalhados de inveja para os índices de 60% da Venezuela e da Argentina. Mas há uma diferença fundamental: a militância de Chávez e Kirshner é armada, a militância petista é desarmada. O PT depende de eleição, e voto só se ganha com o povo satisfeito em poder comprar uma geladeira nas Casas Bahia pagando em quinze vezes. Se deixar a inflação voltar, babau: a carruagem volta a ser abóbora, e os milhões que passaram à classe C voltam à classe D. O remédio é maldizer FHC.
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