sexta-feira, 9 de junho de 2017

A História acontecendo: a cracolândia

Um fenômeno raro que eu gosto e assistir quando tenho oportunidade são os fatos se interpondo às teses. Isso é ver a História acontecendo em tempo real.

Semana passada houve uma ação na conhecida cracolândia, reduto de consumidores de crack em São Paulo, por iniciativa do prefeito Dória, considerada truculenta e que motivou numerosas críticas. O médico Dráuzio Varella comentou na Folha de São Paulo:

Todo o mundo tem que se convencer que não é possível acabar com a cracolândia. A cracolândia não é causa de nada, é consequência de uma ordem social que deixa à margem da sociedade uma massa de meninos e meninas nas periferias nas cidades brasileiras, sem qualquer oportunidade. Pararam de estudar com 13, 14 anos e acabam indo por este caminho.


Ou seja, o indivíduo vai se drogar cracolândia porque a sociedade não lhe deu oportunidade. Tivesse tido oportunidade, estaria andando pelas ruas muito limpo e direitinho, indo para o trabalho. Será?

Outros comentaristas, como nesse artigo de Aldo Fornazieri, repetiram chavões como "nazismo", "pogrom" e "elite branca", mais uma vez dando uma leitura de luta de classes à ocorrência. Mas na mesma semana dois acontecimentos bem inusitados vieram desmentir essas assertivas. O primeiro foi o encontro, em plena cracolândia, de ninguém menos que o cidadão Andreas von Richthofen, irmão da notória Suzane von Richthofen. Rapaz rico, inteligente, com doutorado em química, foi preso totalmente drogado, transtornado e maltrapilho em meio aos viciados. Outra notícia dá conta de que um certo Carlos Eduardo Albuquerque Maranhão, ex-aluno do conceituado Colégio Santo Inácio, criado no conceituado bairro do Jardim Botânico no Rio de Janeiro, é habitante da cracolândia. O que demonstra de forma cabal que o vício nada tem a ver com a condição social Ambos tiveram todas as oportunidades cuja falta, afirma Dráuzio Varella, é a causa da existência da cracolândia. São exceções? Sim, são. Mas de modo geral, ser rico no Brasil é uma exceção, seja a amostra colhida na cracolância ou em qualquer outro lugar.

Andreas von Richthofen e Carlos Eduardo se tornaram drogados em razão de graves problema psicológicos, no primeiro, quase que certamente, decorrentes da tragédia familiar, e o segundo de causas não conhecidos, mas amigos afirmaram que ele já se drogava desde os tempos do Santo Inácio. Nada a ver com condição social. Os outros drogados pobres provavelmente tiveram um histórico semelhante, e certamente menos recursos para trata-lo. Carlos Eduardo, aliás, faleceu dias depois de haver sido internado. Estaria vivo se houvesse sido internado à força bem antes desta semana?

De qualquer modo, os críticos viram como um grande fracasso a operação montada pelo prefeito Dória. Argumenta o artigo do já citado Aldo Fornazieri:

Na ação espetaculosa do prefeito contra a Cracolândia foram presos 38 traficantes e apreendidas algumas armas. O que consta é que nenhum desses presos é um grande traficante, um chefe do tráfico em São Paulo. Ou seja, os extraordinários gestores de São Paulo estão enxugando gelo.

Mais uma vez se incorre no erro de achar que o crime é como um organismo vivo em que, se cortando a cabeça, todo o resto vem abaixo. Como se os chefes do tráfico não pudessem ser prontamente substituídos. O crime, contudo, só pode ser combatido pela base, e não pelo topo. Cracolândia por cracolândia, esquina a esquina.


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