domingo, 28 de julho de 2024

Lula está "dilmando"?

O governo Bolsonaro teve um deempenho econômico pífio, mas não quebrou o país. O governo Lula teve um início tranquilo. Mas já dá sinal de estar "dilmando", expressão recém-criada que denota a entrada em um espiral de declínio pela repetição de velhos equívocos. O assunto foi abordado pelo The Economist nesse vídeo que critica Lula como perdulário. Segundo afirma, Lula age como se o país fosse mais rico do que é.

Não surpreende. Há décadas, o Brasil e demais "emergentes" da América Latina oscilam entre o estatismo e a desestatização, como se não conhecessem outra fórmula. Chega a ser uma obsessão doentia. Na verdade, a desestatização nada mais é do que a inevitável venda de ativos de um estado quebrado, que mais cedo ou mais tarde acaba sendo seguido por mais um ciclo de estatismo. A ideia é que o Estado deve ser o indutor do desenvolvimento, gastando sempre mais do que dispõe e endividando-se, como se o retorno aos investimentos do Estado na infra-estrutura fosse sempre capaz de tapar o rombo a tempo de repetir-se o ciclo.

Mas Lula pode até ser considerado um participante moderado dessa síndrome. Nada comparado a uma Argentina, ou mais recentemente, a uma Venezuela. Em seu primeiro governo, Lula não dilapidou o legado do Plano Real. O descalabro começou com Dilma, sua sucessora, que foi retirada do cargo e sucedida por governos que pouco puderam fazer além de consertar o que ela fez.

O Lula do segundo governo parece uma versão cansada do Lula do primeiro governo. Em comum, tem a sorte de pegar um país com as contas mais ou menos equilibradas. Mas não sabe fazer diferente: mesmo com voz cansada, dá todos os sinais de que está "dilmando", repetindo as mesmas fórmulas fracassadas, aumentando o gasto público, afugentando os investidores. Alguns economistas até preveem uma data para a quebra do país: 2026 ou 2028, conforme as previsões. Após essa data, o desequilíbrio das contas públicas inevitavelmente afundará o país em recessão e inflação.

Mas se Lula está dilmando, haverá outra Dilma? Um sucessor, posto que em razão da idade, o próprio Lula dificilmente se habilitará a um novo mandato. Mesmo porque, sua especialidade sempre foi deixar a bomba estourar na mão dos outros. Se as previsões catastrofistas estão corretas, Lula deixará o governo a tempo de que a bomba não estoure em suas mãos, e o que vier em seguida pode ser atribuído à imperícia de seu sucessor. Mas não se sabe se esse sucessor será do PT. Caso não seja, será mais um "direitista", obrigado a tomar medidas impopulares para restaurar as contas públicas, assim preparando o cenário para novo ciclo de gastança chefiado por um governo de esquerda.

Mas se o sucessor fou um petista, pode ser a desmoralização. Como não dá para rejuvenecer Lula, e mesmo se desse, ele não toparia porque não entra em canoa furada, então o remédio será o PT se reinventar. Talvez assim finalmente consigamos quebrar o ciclo que se repete desde a Era Vargas.

domingo, 21 de julho de 2024

A Venezuela elege quem quiser

A recente declaração de Lula, a Venezuela elege quem quiser, mostra bem como o presidente quer fugir do assunto, e com certeza vê que o declarado apoio que deu ao regime chavista no princípio do mandato, agora é motivo de embaraço.

Não me surpreende que Lula apóie o regime chavista, pois democrata ele nunca foi - em tempos passados já havia dado declarações apoiando o regime cubano. Se ele se considera democrata, então não sabe o que é democracia. Mas por outro lado, Lula nunca mostrou apreço por dogmas ideológicos, nem por qualquer outra coisa que demande esforço para ser entendida. Sempre foi pragmático e oportunista. É certo que repetiu frases feitas em várias ocasiões ao longo de sua carreira, mas uma impressão que me acompanha é que ele sempre teve desprezo pelos "intelectuais orgânicos" do PT, aquela turma aburguesada de militantes de academia, incapazes de compreender que o real povão nada tem a ver com a idealização que fazem.

Mas isso agora é passado. Quem está no poder não é o PT, é Lula. O PT, como projeto político independente, morreu após o mensalão e a lava-jato, e nunca mais conseguiu remontar o gigantesco esquema de desvio de dinheiro público para os cofres do partido, que como se sabe, visava torná-lo todo poderoso e hegemônico, espécie de PRI mexicano versão brasileira. Agora sobrevive atado ao carisma de Lula.

E Lula, o pragmático, acordou com uma batata quente nas mãos. Em que lhe servirá o apoio prestado ao regime chavista, agora que este se encontra no ápice de gigantesca crise, apregoando ameaça de guerra civil? Sem falar na ameaça de guerra externa contra a Guiana. Lula vai intervir para ajudar seu aliado? Mandar tropas? Dar dinheiro? Apoio diplomático? Em qualquer dessas hipóteses, vai sobrar para o país mais do que os refugiados que já estão sobrando.

O caso da Venezuela é intrincado, pois não se trata de uma eleição com partícipes de um mesmo jogo político - um deles, Maduro, está pronto a melar o jogo, e tem todas as possibilidades para isso, e o outro, na remota hipótese de se sagrar vencedor e assumir, terá que desmontar o regime, o que é impossível de ser feito sem luta. Somente uma solução negociada pode permitir uma retirada pacífica dos atuais mandatários chavistas, mas não se antevê essa solução em lugar nenhum.

Um dado curioso sobre o regime chavista é que ele parece ter se inspirado bastante no antigo regime militar brasileiro. Lá como aqui, foram permitidos partidos politicos e eleições a fim de expor um simulacro de democracia, mas os oposicionistas com possibilidade de vencer são cassados, e as regras do jogo são mudadas sempre que a oposição tem reais chances de chegar ao poder. Soa familiar? O regime também cria "falsos opositores" a quem permite se candidatar. Golbery do Couto e Silva fez escola.

Outro dado é que o regime abusa de plebiscitos, igualmente para dar uma impressão de democracia. O plebiscito é descrito como a consulta mais democrática que existe, posto que o povo decide diretamente, sem a necessidade de representantes. Isso é fato. Mas o plebiscito é indicado para decisões pontuais, sim ou não. O regime fez plebiscitos para aprovar verdadeiros pacotes onde o poder do executivo era fortalecido, ardilosamente mesclados de concessões populistas, podendo o eleitor apenas dizer sim para tudo ou não para tudo, como a mãe que diz ao filho: se não comer a verdura, também não come o doce.

Historicamente, o plebiscito tem sido mais usado por ditaduras do que por democracias. O próprio Hitler convocou dois plebiscitos antes de estabelecer seu poder absoluto.

O cenário venezuelano é totalmente incerto. A única certeza é que vai sobrar para nós. Haverá possibilidade de fazermos uma mediação eficaz, promovendo a saída do chavismo sem derramamento de sangue? Por hora, Lula só quer fugir do assunto. A Venezuela elege quem quiser...