1)
O movimento foi fomentado pelos EUA.
Todos sabem muito bem que nos tempos da guerra fria, tanto
os EUA quanto a ex-URSS e seus satélites intervinham ostensivamente em todos os
lugares onde houvesse um movimento comunista efetivo ou potencial. No Brasil
não foi diferente. É perfeitamente sabido que os EUA injetaram muito dinheiro
nos partidos e organizações anti-Goulart. Mas o que até hoje causa realmente
frisson na galera é a Operação Brother Sam, o envio da 4ª frota americana para
apoiar os revoltosos. Fico impressionado como tantos a denunciam à boca pequena,
como se tratasse de um segredo sujo. Mas eu me lembro muito bem: após 12 anos,
em obediência ao regulamento da CIA, o documento foi desclassificado e
publicado na imprensa. Foi em 1976. E saiu tudo lá: a 4ª frota americana fez um
passeio, e no quinto dia, sem haver sequer chegado perto da costa brasileira,
fez meia-volta e retornou, pois nenhum apoio era mais necessário. Estava
inicialmente autorizada a somente enviar combustível aos revoltosos. O que
aconteceria depois, caso Goulart resistisse? Haveria um desembarque? Bom, isso
já é futurologia.
2)
Os comunistas estavam prestes a tomar o poder.
Não estavam, e isso ficou patente na ausência total de
resistência, quando se dizia que Goulart tinha um formidável “dispositivo
militar”. O poder dos comunistas foi grandemente superestimado, tanto por seus
inimigos, o que era do interesse dos mesmos, mas também pelos próprios
comunistas, o que foi desastroso para eles. Exatamente como já havia sido em
1935. Dizia-se que Goulart estava cercado de comunistas. Na realidade, os
comunistas que cercavam Goulart eram os mesmos que antes cercaram Vargas e
Kubitschek, a diferença foi que Vargas e Kubitschek puseram-se os comunistas a
seu serviço, enquanto Goulart foi posto a serviço dos comunistas.
3)
Não havia guerrilha em 1964, e esta só surgiu
depois do AI-5, como resistência à ditadura.
Muita gente acreditou isso, mas foi o insuspeito Jacob
Gorender quem tratou de desmenti-lo em definitivo, em seu clássico Combate Nas
Trevas: os primeiros grupos das Ligas Camponesas foram enviados para fazer
curso de guerrilha em 1962, dois anos antes do golpe. É curioso afirmar que os
guerrilheiros pós-AI-5 tinham como objetivo restabelecer a democracia, pois
nenhum manifesto lançado por eles exigia a restauração da constituição de 1946
ou a volta do ex-presidente Goulart. Mesmo porque, na retórica dos
guerrilheiros, o regime que havia aqui antes de 1964 não era democrático, mas
tratava-se de uma “democracia burguesa” que devia ser derrubada e substituída
por conselhos populares. Dizer como seria o regime instalado pelos
guerrilheiros caso fossem vitoriosos é futurologia, mas tudo indica que seria
inspirado pelo modelo cubano, que inspirava dez entre dez revolucionários
sul-americanos na época. A esquerda só conformou-se à dita democracia burguesa
após a anistia.
4)
Os revolucionários de 1964 não queriam o poder,
mas apenas a restauração da ordem.
É mentira. Havia uma conspiração articulada desde a época do
suicídio de Vargas, e esse esquema reunia essencialmente políticos udenistas
com militares da ESG. Havia o consenso de que, pela via eleitoral, eles não
chegariam ao poder, então aguardavam uma revolução providencial. Antes já
haviam tentado impedir a posse de Juscelino e do próprio Goulart. Como se sabe,
as coisas não saíram bem como planejado, e a maior parte dos conspiradores da
época foi expurgada no momento em que supunham estar chegando ao poder.
5)
O dito Milagre Brasileiro foi uma época de
extremo sofrimento para os trabalhadores, pois foi conseguido à custa da
concentração de renda.
É uma interpretação maliciosa da realidade econômica e
social da época, que procura passar a ideia de que os mais ricos enriqueceram à
custa de empobrecer os mais pobres, como se estivessem subtraindo a renda
destes. Houve de fato um aumento na concentração de renda. Mas a concentração
de renda é nada mais que uma estatística que informa qual percentual da
população detém qual percentual da renda nacional. A porção mais rica prosperou
mais rápido que a porção mais pobre, daí haver aumentado sua participação na
renda, em termos relativos. Mas em termos absolutos, tanto a renda dos mais
pobres quanto a renda dos mais ricos subiu, e para quem é pobre, evidentemente
o que importa não é o relativo, mas o absoluto. A prova disto foi a notória
ausência de elementos das classes populares nos movimentos guerrilheiros, que
contavam quase que exclusivamente com intelectuais, egressos do movimento
estudantil, ex-militares e religiosos. Por este motivo mesmo os grupos
guerrilheiros foram incipientes, e a própria dispersão das siglas – VPR, PCR,
VAR, COLINA, MR-8, PCO, etc. - é uma evidência disto.
6)
Os governos militares foram entreguistas e
submissos aos EUA
Uns mais, outros menos. De maneira geral, os militares deram
prosseguimento ao modelo do nacional-estatismo que vinha desde os anos trinta,
que preconizava forte presença do Estado na economia. Durante os quatro governos
militares, a aplicação deste modelo oscilou entre sua vertente nacionalista
(Vargas, Geisel) e sua vertente dita entreguista (Kubitschek, Castelo).
7)
O regime militar introduziu a tortura no Brasil
Já havia tortura antes, e continuou a existir depois. Mas
era tortura a presos comuns, marginaizinhos pé-rapados, e esse fato não
despertava comoção. O choque causado pela tortura durante o regime militar
deveu-se sobretudo ao fato desta ser aplicada a jovens da classe média,
indivíduos que, de acordo com a crença geral, não deveriam sofrer este
tratamento.
8)
Havia menos corrupção / Havia mais corrupção na
época
Os defensores do regime de 1964 afirmam que havia menos
corrupção naquele tempo, e os detratores afirmam que havia muito mais, mas a
censura não deixava a população saber. É evidente que havia corrupção naquele
tempo, mas não é razoável supor que algum grande escândalo tenha permanecido
oculto até hoje, tantas décadas após o fim da censura. A verdade é que a
própria estrutura autoritária do regime tornava desnecessário maiores barganhas
e compras de voto de parlamentares.
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