domingo, 27 de julho de 2025

América Latina: Lado B

Estou lendo o livro América Latina: Lado B, de Ariel Palacios, onde o autor rememora inumeráveis episódios bizarros, lamentáveis e folclóricos que permearam a história de nosso continente. Não é uma obra de historiografia, mas não deixa de ter a utilidade de fazer pensar sobre o lado mórbido de nossa civilização. Mórbido é a palavra certa.
 
Mas fica a pergunta no ar: por que autor excluiu o Brasil de seu apanhado? Acaso também não temos um lado B?
 
Pode-se criticar, mas eu dou razão ao autor. Por mais coisas baixas e lastimáveis que tenham acontecido aqui, não, o Brasil não se nivela a nossos vizinhos hispânicos. Tivemos nossos ditadores, mas nenhum deles renomeou cidades com o seu nome em vida. Temos nossos corruptos, mas nenhum deles se tornou dono do país inteiro junto com sua família. Tivemos nossos episódios de violência política, mas o número de mortos e desaparecidos é bastante baixo se comparado a nossos vizinhos. Tivemos manifestações reprimidas a bala, mas nenhuma deixou o saldo de dezenas de mortos.
 
Temos nossos bandidos, mas eles não são bilionários, não dominam cidades inteiras nem vastas áreas rurais, como é comum nos países onde os criminosos controlam a produção e o roteamento de drogas para os principais mercados consumidores. Nossos bandidos dominam, no máximo, as favelas, e sua riqueza se expressa, no máximo, na construção de fortalezas no topo das favelas. Somos consumidores, e não produtores de drogas, e como rota somos secundários. A criminalidade derivada das drogas está concentada nos pontos de varejo, ou seja, nas favelas. Aqui soaria ridículo um mega-traficante oferecer-se para pagar a dívida externa do país, como aconteceu na Colômbia. Igualmente piada sem graça seria outro mega-traficante declarar que não pretende ser presidente do país, porque manda mais que o presidente. Quando El Chapo fez essa declaração no México, ninguém achou graça.
 
Basicamente, nossas baixarias carecem de uma morbidez que está presente em nossos vizinhos. Por que foi assim? Penso que tratou-se da consequência da maneira negociada com que foi obtida nossa independência, sem o trauma de uma longa guerra que naturalizou a violência política extrema na América Hispânica dominada por caudilhos. Historicamente, nós preferimos a negociação. Não sei se é a melhor teoria, mas é a que eu tenho.