sexta-feira, 14 de abril de 2017

Quando a História trava

Lembrando o chavão nem tão velho assim, que garantia que o Brasil é o país do futuro, chega a ser irônico fazer esta constatação: nossa História travou.

O panorama atual parece garantir que o passado passou. A Era PT teve começo, meio e fim, e não apenas ela, mas todo um modo de fazer política parece estar sendo soterrado por escândalos e investigações. Mas não se divisa o futuro. Não se vê a luz no fim do túnel. Nenhuma nova liderança, nova corrente ou novo partido surge na esquina - nem mesmo aqueles arrivistas que costumam aparecer nos momentos de crise. Um bom exemplo dessa atual incapacidade de andar para a frente é o fato de que o candidato com mais intenções de voto para 2018 é o ex-presidente Lula, apesar da convicção generalizada de que ele já cumpriu o papel que tinha a cumprir na História brasileira. Nesse cenário, foi surpreendente ler esse artigo de Demétrio Magnoli, notório desafeto do PT, clamando para que Sérgio Moro ande devagar e não impeça Lula de concorrer às próximas eleições.

Não corra, Moro: o Brasil precisa da candidatura de Lula

A esquerda que clama pela volta do ex-presidente abdicou do sistema econômico socialista, mas continua seduzida pelo monopólio do poder por um “partido dirigente”. A catástrofe venezuelana não merece uma linha de protesto dos fabricantes de manifestos. O Brasil precisa da candidatura de Lula para derrotar, no debate eleitoral, o conceito de que só merecem repúdio as ditaduras de direita

Surpreendente não pelo conteúdo, mas pela coragem de dizê-lo, pois eu próprio já compartilhava essa opinião desde muito: o país precisa da candidatura de Lula em 2018 para que a nossa História enfim destrave.

Lula converteu-se em representação de um Brasil que se recusa a romper com o passado e de uma esquerda hipnotizada por utopias regressivas de segunda mão


Concordo: Lula não é o futuro, mas é a sombra do passado que paira sobre o presente. Diante da pasmaceira do cenário atual, muitos haverão de sentir saudades dos vibrantes anos de Lula. Sabemos que os bons resultados na época deveram-se a uma conjunção de fatores positivos para nossa economia, embora não se deva negar o mérito de Lula em optar pelo pragmatismo e pela manutenção da macroeconomia herdada do Plano Real, que garantiu a estabilidade e permitiu ao país usufruir dos ventos favoráveis. Reconhece Demétrio, Lula é um pragmático, e não um ideólogo. Mas ao anunciar a Nova Matriz Econômica no meio de seu segundo mandato, armando a bomba que viria a estourar no colo de sua sucessora, Lula confirmou seu compromisso com o passado. Não é necessário denotar aqui os maus resultados que se seguiram, confirmando o anacronismo do ideário nacional-estatista neo-varguista apregoado pela velha guarda do PT, que Lula deveria ter descartado em definitivo enquanto teve o poder. O resultante fracasso da economia explica a queda do governo Dilma com pouca ou quase nenhuma resistência popular.

Se, no entanto, Lula for processado e impedido de disputar as eleições de 2018, a indagação ficará aos olhos de todos: e se Lula fosse o presidente?

Seja quem for que vença as eleições, terá sobre si a sombra de Lula e as especulações daí advindas, que com o tempo se tornarão um mito, tal como aconteceu com a Argentina de Evita Perón, que conforme sabemos, conheceu um período economicamente muito favorável graças aos saldos da balança comercial do tempo da guerra, cujo fim coincidiu com a morte por causas naturais da primeira-dama militante, nascendo daí a obsessão nacional: ressuscitar os bons tempos de Evita e Perón. É a sombra do passado que impede a chegada do futuro, e para que nossa História destrave, é imprescindível, sim, que Lula dispute as eleições de 2018. Derrotado, seu tempo estará definitivamente confinado ao passado. Vitorioso, terá a oportunidade de optar mais uma vez pelo pragmatismo, desvencilhar-se do superado ideário esquerdista e fazer um bom governo. Então seu papel na História estará escrito.

domingo, 2 de abril de 2017

Nem contra, nem a favor, muito pelo contrário

Não me lembro de nunca ter visto o país em uma pasmaceira tão grande quanto agora. O presidente tem o menor índice de aprovação da história, mas não se vê nas ruas gente clamando pela volta de sua antecessora, cujo índice de aprovação não era  muito diferente. Pequenos protestos aqui e ali em meio a um deserto de ideias, não há praticamente nada que estimule a imaginação, nem otimismo, e curiosamente, nem pessimismo. Será a calmaria que antecede as tempestades? Ou o silêncio obsequioso de quem finalmente amadureceu e abandonou suas utopias infantis?

O momento nacional está bem retratado em uma pesquisa com resultados aparentemente contraditórios que descobri nesse artigo do Jornal GGN. A pesquisa foi realizada sobre manifestantes que compareceram em ato realizado na avenida Paulista no último dia 26. Como o ato foi convocado por organizações de direita, as opiniões deveriam ter ido conformes, mas não foi bem assim.
  Sobre o nível de conservadorismo de cada entrevistado, a pesquisa identificou um nicho de 47% que se disse "muito conservador", 34% de "pouco conservador" e 14% de "nada conversador". 
 Quando questionados sobre posicionamento político, 31% se disseram de direita, 17% de centro-direita e 36,3% disseram "nada disso", negando vinculação a qualquer corrente ideológica. A soma dos que responderam de centro-esquerda ou esquerda chegou ao patamar de 10%. 
 À pergunta "Você é a favor da permanência do presidente Temer no governo?", 46,5% disseram que não e 46,9% disseram que sim, enquanto 6,6% não souberam opinar.
 A união inegável entre os manifestantes certamente apareceu nas respostas à pergunta "Você se considera antipetista?". Aqui, quase 85% responderam "muito antipetista", 5% "pouco antipetista" e 9%, "nada antipetista".
Quando a questão foi "Você concorda com a reforma da Previdência?", 74,8% repudiaram a proposta encampada por Temer, ante 19,3% que concordam com a reforma. Outros 5,9% não souberam responder.
Resultados curiosos. Quase todos se afirmaram fervorosamente antipetistas, como já era esperado, mas também não estão animados com o presidente Temer, haja visto que metade é contra a sua permanência no governo, e rechaçam decididamente a reforma da previdência proposta por ele. Quase todos se declararam conservadores, mas a maioria rejeitou o rótulo de direita. Nem lá, nem cá. Quando a pergunta foi sobre a filiação política, o resultado foi estrondoso:

Diante de uma lista de partidos, 11% disseram ter afinidade com o PSDB. O segundo mais votado foi o partido NOVO (6%), seguido de DEM (1,6%). As demais legendas não conquistaram mais de 1% dos votos. A grande maioria, porém, respondeu que não tem afinidade com nenhum partido: 72,9%.
A única certeza produzida é que há um notório descompromisso com todos os partidos e os políticos em geral. O descontentamento é amplo, mas não há ideias no ar, nem salvadores da pátria. Fica a impressão de um imenso vácuo à frente a ser ocupado... por quem?

Penso que vamos ter mesmo que esperar até 2018. Mas com certeza alguém irá ocupar esse vácuo. A natureza odeia o vácuo, e os que tem horror à política são governados pelos que não têm.