quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Mas afinal, os blog´s estão acabando?

Dizem que as redes sociais estão acabando com os blog´s, pois proporcionam uma interatividade muito maior e um público também maior. Isso para mim é lamentável. Nada contra as redes sociais, inclusive tenho Facebook. Apenas acho que uma coisa não tem a ver com a outra, tanto que nem coloco aqui o endereço de meu Facebook. Redes sociais são para contatos sociais, e o meu perfil ali interessa somente a meu reduzido círculo social e familiar. Blog´s são voltados para assuntos específicos, neste aqui nunca falei de mim mesmo, mesmo porque não considero a minha pessoa um tema assim tão interessante. Estou aqui para falar de História e Política.

Entretanto, eu tenho mesmo observado que meus blog´s favoritos estão com cada vez menos frequentadores. Será que todos preferem agora reunir-se no Facebook? Lá eu me sinto como na hora do recreio dos antigos colégios, aquele burburinho de todos falando ao mesmo tempo sobre os mais variados assuntos. Nada contra, desde que você só queira falar abobrinha. Nos blog´s, eu me sinto como em um grupo de estudos. Numerosos blog´s que já encontrei por aí são de nível altíssimo, inclusive superiores aos que você encontra na mídia comercial. Penso que na internet, como em tudo, quantidade não é qualidade.

Longa vida aos blog´s! Ou se vão encolher, espero que ganhem em qualidade.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Confiança, de Fukuyama: nós e a Coréia

Estou lendo bem devagar o livro Confiança, de Francis Fukuyama, tido como o melhor que ele escreveu (embora não o mais vendido) e que encomendei de um sebo, pois está esgotado nas livrarias. Quando saiu em primeira edição, foi tão pouco divulgado que acabei não comprando.

Queria há muito ler esse livro, mas é sempre algo decepcionante quando você entra na expectativa de uma confirmação de suas certezas, e termina, ao contrário, com dúvidas. Foi o que aconteceu no capítulo da Coréia do Sul. Explicando, sempre tive especial apreço por este país, que conheci em duas proveitosas viagens a trabalho feitas em 1992, e sempre o tive como modelo para o Brasil em questões de desenvolvimento econômico - vi na Coréia tudo aquilo que o Brasil poderia ter feito, e não fez. Sempre considerei a causa primária de nosso atraso o modelo de gestão de nossas empresas, dependentes de subsídios estatais, síndrome cuja causa profunda é cultural, apontada por Fukuyama: a falta de confiança entre cidadãos privados em nossa sociedade. O modelo oposto: sociedades de alta confiança, como os EUA e o Japão, onde as empresas são formadas e geridas por múltiplos acionistas e executivos assalariados, sem dependência do Estado. Parecidos conosco são os países do sul da Europa, onde a baixa confiança manteve as empresas confinadas nas mãos pouco competentes dos clãs familiares ou do Estado, e a China, cuja sociedade segue modelo semelhante.

No entanto, o autor reconhece que a Coréia do Sul, estrela dos países emergentes, tem mais semelhanças com a China, modelo negativo, do que com o Japão, modelo positivo. De fato, os chaebol (grandes conglomerados) coreanos foram formados mediante subsídios, proteção, regulação e outras modalidades de intervenção governamental - enfim, nada muito diferente do que tem sido feito por aqui desde os tempos de Vargas. Por que com eles deu certo, e conosco deu errado? Frustrante isso.

Terá sido o fator de diferenciação o ditador Park Chung-hee, que governou a Coréia do Sul entre 1961 e 1979, e é tido como o artífice do milagre econômico por que passou o país? Ditadores, também os tivemos, bem como "milagres econômicos". Será que os ditadores deles são melhores que os nossos? Park Chung-hee, de fato, é reconhecido como um governante repressivo, mas de conduta pessoal austera e competência na condução dos negócios. Mas repugna-me atribuir fenômenos tão amplos à atuação de um único homem, ou super-homem que seja. Vamos ver se até chegar ao final do livro eu encontro uma resposta que me convença. Mas quando passo pelo centro de São Paulo e vejo ali tantos coreanos, não posso deixar de pensar que talvez brasileiros e coreanos não sejam assim tão diferentes...

domingo, 8 de fevereiro de 2015

Dilma II: Dejà Vu

A divisa Pátria Educadora, lançada como bordão deste segundo governo Dilma, para mim soou como dejà vu. Um inconfundível gostinho fascista. Surpreende eu dizer isto? Hoje em dia, o senso comum assumiu o fascismo como sendo o oposto do socialismo. Mas quando surgiu lá pelo início do século vinte, o fascismo vinha do mesmo tronco que o socialismo. Ambos regimes compartilham simbologia e rituais, ambos são voltados ao coletivo e ao espetáculo: pompa, fanfarra, estudantes e operários desfilando uniformizados, bandeiras, divisas altissonantes como esta Pátria Educadora... Para quem conhece a História, nada disso é surpresa: o PT é o herdeiro do trabalhismo de Vargas, cujo Estado Novo foi a versão tupiniquim do fascismo que estava na moda. A própria legislação trabalhista legada por Vargas, que Dilma jura não modificar nem que a vaca tussa (Cof! Cof!) é uma cópia descarada da Carta Del Lavoro de Mussolini.

Tanto paralelismo entre o passado e o presente faz-me crer que os partidos políticos, tal como as pessoas segundo os espiritualistas, quando morrem, reencarnam posteriormente: no fundo, não há nada de novo no panorama político brasileiro, ao menos para quem conhece a História. Estamos apenas vendo os velhos partidos sob nova roupagem. Conforme foi dito acima, o PT é a reencarnação do velho PTB de Vargas, o partido dos sindicalistas pelegos que tem como mote o nacional-estatismo, com seu séquito de empresas estatais (o petróleo é nosso!) e os bancos estatais despejando dinheiro para os empresários amigos-do-rei. Mas quem é a reencarnação da velha UDN, o inimigo figadal do PTB?

Aparentemente é o PSDB. Mas há um problema: no espectro político dos anos cinquenta, a velha UDN ficava à direita tanto do PTB quanto do PSD, o partido centrista. No espectro político atual, o PSDB fica à direita do PT, mas à esquerda do PMDB e demais partidos de centro. De resto, o PSDB sempre se definiu como de social-democrata e nunca encampou o discurso da antiga UDN, embora tenha-o implementado na prática em algumas ocasiões por razões de pragmatismo (mas esse pragmatismo o PT também é capaz de fazer, como está acontecendo nesse início de governo Dilma com a escolha de um ministério orientado ao mercado).

A meu ver, a origem da confusão está em um equívoco semelhante àquele que toma os fascistas como sendo o oposto dos socialistas, quando na realidade ambos derivaram do mesmo tronco, frutos do mesmo zeitgeist. O lugar-comum esquerdista colocou a UDN no passado, e os trabalhistas no futuro: segundo se crê, a UDN representava tudo o que havia de mais reacionário na política nacional: era o partido dos ricos, dos financistas, dos oligarcas e das multinacionais estrangeiras, inimigo dos trabalhadores. O PSDB, na condição de principal antagonista do PT, teria herdado esse papel.

Mas é falso. Tanto o PTB quando a UDN, ao surgirem, sinalizavam uma ruptura com o passado. Ambos são produto das transformações sociais por que o Brasil passou na época da revolução de 1930, quando duas novas classes sociais emergiram, o operariado e a classe média urbana. O PTB encampou os desejos do operariado, e a UDN, os desejos da classe média urbana; desta forma, PTB e UDN tornaram-se antagonistas, mas frutos do mesmo zeitgeist. O verdadeiro partido reacionário da época não era a UDN, mas o PSD, que congregava tudo o que restara da velha política: era o partido isento de ideologias, feito apenas de uma malha de interesses, e por esse motivo basicamente venal, pronto a aliar-se a quem se propusesse a atender seus interesses. Vargas bem sabia disso, e cuidou de manter o PSD em sua base de sustentação.

Não resta dúvida de que a encarnação atual do velho PSD é o PMDB. Mas uma peça insiste em não encaixar: onde está, afinal, a reencarnação da UDN? O PSDB é a reencarnação de quem?

Na realidade, os ideais udenistas não desapareceram, estão dispersos por aí. São notados diuturnamente em cada blog que critica o caráter populista e condena a corrupção do governo. Mas não existe mais um partido político que assuma esse ideário, embora a prática dita "neoliberal" possa ser feita, por razões de pragmatismo, tanto pelo PSDB quanto pelo PT. Então, se na época atual, PTB e PSD são fantasmas rondando os vivos, a UDN foi reduzida a um fantasma rondando fantasmas. A origem dessa exclusão do udenismo do espectro político nacional pode ser rastreada no Movimento de 1964. Até então a UDN encampava os ideais da classe média urbana, mas porque aderiu ao novo regime, passou a ser rejeitada por esta classe média, que tornou-se cada vez mais esquerdista em repúdio à ditadura. O udenismo tornou-se politicamente incorreto, embora essa expressão ainda não existisse na época, e ninguém nunca mais quis assumir o seu legado.

O mais irônico, contudo, foi que o golpe fatal na antiga UDN veio do próprio governo militar que ela apoiou. O regime de 1964 era uma tecnocracia que sempre prescindiu da política partidária, e o partido de sustentação do governo, assim como o partido de oposição, foram mantidos apenas pro forma. Assim que firmou-se no poder, o regime tratou de liquidar quaisquer lideranças políticas que pudessem contrapor-se aos tecnocratas, inclusive as lideranças da direita. Isso foi fatal para a UDN, cuja liquidação ocorreu em dois momentos: primeiro, pela cassação da vanguarda do partido, e segundo, por impedir o surgimento de uma nova vanguarda. Esse impedimento foi uma consequência da legislação instituída pelo regime, cuidadosamente calculada para tornar inoperante toda a política partidária e parlamentar. Um dos postulados era a subordinação dos centros urbanos aos rincões do interior, cujo peso nas convenções e assembléias era sempre maior. Assim, quem pontificava na ARENA, o partido do governo, não era a vanguarda udenista dos Carlos Lacerda e San Tiago Dantas, mas políticos provincianos, de José Sarney a Célio Borja, gente que antes de 1964 provavelmente nunca imaginara que um dia seriam líderes de seus partidos e presidentes da câmara e do senado. A antiga UDN foi triturada e depositada na vala comum da ARENA, que nada mais era que a reencarnação do antigo PSD, tal como o atual PMDB é a reencarnação da antiga ARENA.

A classe média brasileira, que foi o sustentáculo do PT em seus primeiros anos, hoje tem motivos para sentir-se abandonada. Voltará um dia essa classe a ter um partido que represente seus ideais? Depende do PSDB assumi-los ou não. Por enquanto, a classe média brasileira continua órfã.